Minha revolta
Quando
eu comecei a ter noção de como era o mundo real (quando chega a
maturidade, no meu caso bem cedo…), eu me sentia incomodado com
algumas coisas que nossa família passava. Não tínhamos coisas
básicas que os meus amigos tinham, coisas como energia em casa,
brinquedos, roupas boas, TV.
Aquilo
me incomodava, e eu sempre me questionava, porque? Porque não temos
coisas básicas? E cada vez que eu me questionava, mais perguntas
surgiam, até que eu decidir que eu não ia viver a mesma vida que
minha mãe e minha avó. Mas como? (mais uma pergunta…) foi quando
o li o livro que mudou minha vida Poder sem Limites livro de Tony
Robbins como eu disse na Parte I.
Foi
ai que eu comecei a enxergar a luz no fim do túnel, e começaria um
longa caminhada e a mudança de diversas crenças e paradigmas
aprendidos na minha infância, eu não sabia como eu faria, eu só
sabia que daria certo. Eu queria, desejava uma vida melhor para mim e
meus irmãos.
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O ensino técnico mudou a minha vida. |
Não
era justo… A vontade de mudar era grande e cada dia aumentava mais,
e a leitura de livros era o que me dava mais força e vontade de
mudar de vida. Até que no último ano do ensino fundamental oitava
série (9° hoje em dia) um amigo de infância me disse que tinha uma
escola técnica federal na capital, e que estava com as inscrições
abertas, eu não fazia noção do que era uma escola técnica. Ele me
disse que era onde você estudava e já saia para trabalhar. Fiquei
impressionado e decidir que ia estudar nessa escola, afinal era de
graça. Mal sabia eu que estava prestes a ter a minha maior decepção
de vida até então…
Qualidade
do ensino
Decidir
que ia estudar na escola técnica federal, só que ainda com aquela
inocência de criança, achando que tudo seria fácil. E não foi…
Eu já sabia que algumas coisas dependiam de mim (estudar) e outras
não. Ter dinheiro para me sustentar na capital por exemplo. Estudei
em uma escola pública e infelizmente a baixa qualidade do ensino das
escolas públicas brasileira ainda é uma triste realidade.
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Triste realidade. |
Eu
tinha que concorrer com alunos das melhores escolas públicas e
particulares do estado, um desafio e tanto. Tenho um amigo de
infância que somos colegas de profissão, viemos das mesmas origens
e passamos pelas mesmas dificuldades e decidimos cedo encarar o mundo
lá fora. Eu e esse meu amigo decidimos estudar para o processo
seletivo da ET (Escola Técnica), nós não tínhamos computador em
casa, pagamos uma hora na lan house para entrar no site da ET, eu
fiquei impressionado era uma escola gigante, com quadras de esportes
piscina uma realidade completamente diferente da minha, eu sonhava
estudando naquela escola, me imagina andando nos corredores, caro
leitor, eu tinha certeza que ia estudar lá, só não sabia como.
Para
você ter noção, eu tinha uma foto da logo da escola no meu
caderno, na capa do meu Orkut, na minha foto de perfil, tinha um
calendário da escola que eles disponibilizavam no site, eu me sentia
estudando lá. Bom, voltando a realidade… Imprimimos o edital e
lemos cada linha com a maior empolgação do mundo, até chegar no
item da taxa de inscrição R$ 25,00.
Vinte
e cinco reais! Como eu ia conseguir R$ 25,00? Parece um absurdo né?
Como uma pessoa não pode ter R$ 25,00! Sim, infelizmente essa era a
minha realidade. Chegamos na parte das matérias que cairia na prova,
uma lista extensa coisa que nós nunca tínhamos visto, matérias que
só veríamos no ensino médio e olhe lá. Nós já sabíamos o que
precisávamos estudar, nosso próximo desafio era encontrar o
material para estudar.
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Sem grana... |
Pegamos
todos os livros que encontramos e praticamente montamos uma
biblioteca, os assuntos que não encontramos em livros pesquisamos
nos computadores da biblioteca da escola. Como não tínhamos
computador em casa, só pesquisar não resolvia nosso problema.
Tínhamos que imprimir o material, mas a questão financeira era o
nosso maior dilema. Eu tinha que dar um jeito… Foi ai que eu e meu
amigo começamos a procurar lotes vazios na cidade para capinar e
ganhar uma grana.
Saiamos
procurando e capinávamos, as vezes demorávamos de 2 a 3 dias para
dar conta do serviço. Franzinos e pequenos era um desafio, mas a
vontade de mudar de vida era maior. Não me recordo bem os valores,
mas nos cobrávamos cerca de R$ 10,00 a R$ 15,00 por capina, foi
assim que eu conseguir juntar dinheiro para pagar o valor da
inscrição e as passagens para ir fazer a prova. Com muito suor e
sacrifício.
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Foi assim que eu juntei o dinheiro que precisava. |
Para
quem tem a mesma idade que eu sabe, que para ter acesso a computador
anos 90/2000 não era para qualquer um. Nos juntamos todo o material
que faltava e imprimimos em uma lan house, a impressão era muito
cara e o dinheiro pouco, para economizarmos eu e meu amigo rachamos o
valor das impressões e revezávamos as apostilas.
A
prova era no final do ano, outubro ou novembro não me lembro ao
certo. Nos começamos a estudar no começo do ano, algumas coisas
tínhamos que aprender sozinhos, matemática era uma delas, nossa
base era muito fraca. Meu amigo teve a ideia de pagarmos alguém para
nos ajudar, só que não tínhamos dinheiro para isso, tive a ideia
de pedir algum dos nossos professores ajuda, infelizmente não
tivemos sorte nenhum deles nos ajudou, diziam que estavam ocupados
(hoje eu os entendo) de volta a estaca zero. Nos éramos muito
persistentes, na cidade tinha uma escola estadual do ensino médio eu
disse a meu amigo que iria lá e pedir alguém para nos ajudar, e lá
fui eu… O não, eu sabia que já tinha… Eu ia era para ouvir o
sim do professor.
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Não custa nada tentar. O não você já tem. |
Conversei
com um professor e ele topou e marcou uma aula de revisão no sábado.
No sábado seguinte fui o primeiro a chegar, meu amigo veio depois e
o professor demorou… Deu 08:00, 08:30, 09:00, 10:00 e nada. Já estávamos quase desistindo, até que o professor apareceu, lembro como
se fosse ontem ele chegou de bermuda e nos pediu desculpa, disse que
tinha perdido o horário e que estava lavando roupa. Sou extremamente
grato a esse professor, por ter nos ajudado de graça e em pleno
sábado, sabendo como é a vida de professor, imagino que tivesse
muitas coisas para fazer e tirou um pouco do seu tempo para nos
ajudar. Hoje eu vejo que o simples fato de ele ter ido lá nos ajudar
fez uma grande diferença em minha vida, talvez se ele não tivesse
nos ajudado nos teríamos desistidos e a minha vida tomado outro
rumo.
A
pior decepção da minha vida
Final
do ano chegou, fomos fazer a prova. Ficamos impressionado com a
escola era muito maior do que eu imaginava. Era uma escola, acho que
umas 5 vezes maior que onde eu estudava. O resultado do processo
seletivo saia em janeiro do ano seguinte, eu ansioso contava os dias
até que o resultado saiu. E eu não passei… Foi uma decepção
muito grande, não era justo. Eu tinha me esforçado, tinha estudado
pra caramba e não passei. Para minha maior decepção meu amigo
tinha passado, para mim estava acabado eu não ia estudar onde eu
tinha sonhado. Lembro que chorei muito… Pior decepção que tive
até então, eu tinha duas escolhas. Continuar chorando e desistir ou
fazer a prova novamente no final do ano. Eu escolhi a segunda opção.
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Como eu me sentir quando vi que não tinha passado. |
A
volta por cima
Enxugado
as lágrimas era hora de agir novamente, poucos dias depois conversei
com meu amigo e disse a ele que faria a prova novamente. Peguei as
matérias que estavam com ele e comecei a estudar novamente, dessa
vez com mais vontade e determinação. Assim fiz durante os meses até
o final do ano. Em novembro, fui novamente fazer a prova lá estava
eu pela segunda vez na escola onde eu sonhava em estudar, fiz a prova
e voltei para casa. Eu tinha me esforçado tanto, que eu estava tão
seguro que esqueci até do resultado da prova que saia em janeiro.
Lembro como se fosse hoje, meu amigo me ligou dizendo para eu ir
arrumar os papéis da matrícula, que eu tinha passado. Eu não
acreditava, fui correndo para a lan house para ver, fui procurar meu
nome na lista era verdade. Tinha conseguido, era o 7° da lista de
aprovados, de um total de 30 vagas. Todo meu esforço e dedicação
tinham valido a pena.
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Nunca desista! |
Passei e agora?
As
aulas começariam depois do carnaval, eu tinha pouco mais de um mês
para ir fazer a matrícula ou perderia a vaga, mais uma vez me vi na
situação em que o que eu podia fazer tinha feito, só que na vida
nem tudo sai da forma como queremos, eu não conhecia ninguém na
capital, minha mãe não tinha condições de me manter lá. E a cada
dia que se passava eu via crescer as chances de eu perder a minha
matrícula.
Meu
amigo que passou um ano antes de mim também não conhecia ninguém,
foi morar de favor em uma casa de um ex-politico da nossa cidade.
Conversei com ele, falei que podeira não conseguir fazer a matrícula
por não ter onde ficar quando as aulas começassem, ele me disse que
a escola dava uma bolsa para quem era de fora e que não tinha como
se manter. Mas a bolsa era só de R$ 200,00 mesmo assim não daria
para me manter em uma capital. Pagar aluguel, água, energia, comida sem chances.
Meu
amigo sugeriu que nós dois conseguiríamos pagar uma kit net se eu
fosse, ele ia procurar. Eu garantir que sim… Eu ia. Fui falar com
minha mãe, minha mãe não é do tipo que desanima e nem dá apoio,
eu acho que no fundo ela não acreditava que eu estudaria fora. Já a
minha vó que nasceu e cresceu em um época diferente não concordava
com a ideia de eu sair de casa e ir morar em outra cidade, sem
conhecer ninguém.
Minha
decisão estava tomada, eu minha mãe fomos fazer a matrícula depois
do carnaval e voltamos para a nossa cidade, a essa altura meu amigo
já tinha arrumado o lugar para morarmos. Felizmente ele conseguiu
encontrar uma kit de 2/4 quartos a dois quarteirões da escola onde
podíamos ir a pé e não gastávamos com transporte coletivo.
No
dia em que eu sair de casa
Acordei
bem cedo, com um sentimento de medo misturado com dúvida. Medo por
nunca ter saído de casa e dúvida por não ter nada garantido. Mas a
decisão já estava tomada, eu ia arriscar. Confesso que foi uma
decisão muito difícil de tomar com 17 anos eu estava entrando em um
ônibus para morar em uma cidade completamente diferente de onde eu
vivi, sem garantias de nada. Sem ter nem o dinheiro da passagem de
volta, caso desse errado, sem dinheiro para comer se precisasse,
ainda bem que eu não ponderei essas e outras coisas senão, não
teria ido.
Jamais
esquecerei desse dia, sentei no lado da janela da ônibus e olhava
para fora, vendo minha mãe e meus irmãos e a cidade onde eu tinha
uma casa, uma família, comida, para mudar para uma outra sem nada
disso. Sem ter certeza de que teria um lugar para dormir, pois a
única coisa que eu levei de casa só foi uma mala, mais nada.
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Jamais esquecerei desse dia. |
Chegando
na capital, meu amigo me mostrou onde íamos morar, depois fomos
conhecer direito a escola, eu mal podia acreditar que o meu sonho de
estudar naquela escola estava tornado realidade.
Foram
os 4 anos mais desafiadores que eu passei, muitas dificuldades
financeiras, alimentação muito fraca (mas graças a Deus nunca
ficamos sem comer) e ao mesmo tempo aproveitei todas as oportunidades
que a ET me proporcionou, fiz vários cursos, tive a oportunidade de
usar vários equipamentos que eu nunca teria condições de comprar,
acesso a saúde, profissionais de educação enfim… Aproveitei o
máximo que eu pude, tanto é que, eu me formei em um dia, e no dia
seguinte já estava com carteira assinada.
O
melhor decisão que tomei na vida
Hoje
eu vejo que todos esses desafios que eu tive que enfrentar, me
trouxeram onde estou hoje. Com uma visão de mundo completamente
diferente da que eu tinha, a força de vontade a determinação foram
os diferenciais que me fizeram sair e buscar uma vida melhor. Fácil?
De jeito nenhum, mas com uma gama de aprendizado que não se aprender
em escola nenhuma. Hoje tenho um curso técnico que depois que eu
terminei nunca fiquei desempregado, e que me rendeu bons salários e
pude ajudar minha mãe.
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Depois
de alguns anos trabalhando resolvi estudar novamente, resolvi fazer um curso superior na
minha área, por perceber que seria um diferencial em minha carreira.
Hoje eu sei que não fui eu quem escolheu a minha profissão, mas sim
a profissão que me escolheu… Voltar a estudar também não foi
uma decisão fácil, eu estava em um bom emprego e tive que largar.
Eu sou a prova viva que a educação muda as pessoas e em nenhum
momento titubeei em voltar a estudar. Termino o curso de engenharia
ano que vem, que também como você já deve saber caro leitor, estou
longe de casa + 1500 km, estudando em tempo integral e vivendo de
bolsa. E uma decisão que tomei e já vejo os bons frutos que eu já
posso colher depois que eu terminar.
Bom
essa é um pouco da história do PZ.